Antes de seguir preciso esclarecer a posição deste blog. Aqui nesse território virtual se acredita que a convivência pacífica entre bicicletas, pedestres e automóveis é o caminho certo para um trânsito mais humano. A abordagem é pró-bicicleta, não anti-automóveis, ok?

Dito isso, vou expor duas campanhas publicitárias de marcas de veículos que me deixaram um pouco chocada, para promover uma reflexão.

A Mitsubishi americana, levando ao pé da letra a intenção de criar uma campanha agressiva, lançou um aplicativo para o Facebook que permite que você atropele seus amigos mais pretenciosos. É isso mesmo, sob o slogan "Great design doesn't have to be pretentious" (em português, um bom design não precisa ser pretencioso), o vídeo interativo - bastante pretencioso, aliás - te permite colocar a foto de um amigo em uma grande tela que será atropelada pelo veículo e se partirá em vários pedaços. "It's time to destroy your friend's pretentiousness" (é hora de destruir a pretenção de seus amigos) é a mensagem final da peça e o botão para iniciar o jogo diz: "Start destroyng" (comece a destruir).

Você pode experimentar a ferramenta aqui.


Imagem do aplicativo da Mitsubishi no momento em que o veículo destrói a imagem de seu amigo pretencioso.



Outra campanha agressiva de automóvel foi ao ar no Brasil no início de outubro, dessa vez pela Jeep. O slogan das peças era "A cidade é uma selva. Seja um predador". Após denúncia de um consumidor, o Conar (Conselho de Autoregulamentação Publicitária) abriu um processo contra a campanha por entender que ela incentiva o desrespeito no trânsito. A campanha já foi alterada na mídia.


Anúncio da Jeep com marcações de um consumidor inconformado.


Campanhas publicitárias como essas me chocam porque estimula um sentimento de superioridade do motorista do veículo em questão em relação a todos os outros elementos que compõem o trânsito. Destrua os pretenciosos, seja um predador, conquiste o seu espaço, você tem razão, não o outro carro, não o ciclista, não o pedestre, você, você, você!


Ninguém vai levar isso ao pé da letra, claro, mas o discurso está na TV, no jornal, na internet na forma de um grande investimento de uma marca mundialmente conhecida que mostra que é legal ser individualista nas ruas (pra não dizer violento) e legitima atitudes que são um retrocesso de pelo menos 3 casas nos esforços por uma interação pacífica no trânsito.

Esse não é o estilo de toda a comunicação do segmento, mas o fato de existirem alguns casos já é motivo de desconforto pra mim. Depois do tom agressivo, ou melhor, associado a ele, acho que uma das principais infelicidades destas campanhas é colocar o foco, o primeiro plano, no papel do motorista, e não no do indivíduo, ou seja, no cara com crise de de meia idade que deseja se sentir jovem de novo, no rapaz que materializa e define seu espírito aventureiro pelo modelo de carro que dirige, no business man que vai ser respeitado pelo carrão que deixa no estacionamento da firma, no pai de família que vai ter conforto com o carro espaçoso, enfim, deu pra entender... Você pode comprar um carro por N motivos e a escolha vai envolver questões práticas e subjetivas, há diversos tipos de desejos estimulados em um comercial de automóvel, mas ser um motorista com mais valor que os demais não pode ser um deles. No trânsito, a preferência é sempre do mais fraco e gentileza gera gentileza.


Pra finalizar e mostrar que outros raciocínios são possíveis, deixo vocês com esse vídeo da Caloi, que faz uma brincadeira com conceitos e nos mostra que o trânsito é, antes de tudo, uma questão de convivência.





E vocês, o que acham destas campanhas?



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